Da natureza ela vem e a partir de seu encontro com mãos humanas é moldada, de acordo com sua inspiração e atenção. Dessa forma, as peças nunca são iguais às antecessoras, são únicas. Representante de uma cultura de eras, milenar no mundo inteiro, com registros no solo brasileiro pelos povos originários anteriores à invasão. Hoje, dominada por povos que resistiram à opressão, e como o homem, transformada do pó da terra ao símbolo de afeto que desperta experiências sensoriais com aqueles com quem tem contato. Em suma, uma obra de arte: a panela de barro.
Extrai-se a argila e o barro. Materiais que sujam, que desvalorizam o que se entende por beleza e o faz brilhar. Tritura, peneira, lava, molha, amassa, modela, seca, enverniza e voilà: a riqueza e a beleza da terra se anunciam aos olhos do público em sua plenitude. Tamanho poder faz com que a panela de barro seja um símbolo cultural capixaba, sendo o utensílio ideal para o preparo de pratos aclamados e da celebração das tradições.
Foi numa busca por uma panela que Roberto Severino João da Silva e Erica Santos Soares da Silva iniciaram sua relação com essa produção ancestral e iniciaram uma produção de panela de barro vianense. Ao observarem uma exposição com os materiais, eles resolveram fazer alguns exemplares, como forma de renda extra e hobbie. Os, até então, contador e enfermeira viram naquela arte uma forma de expandir sua perspectiva de crescimento futuro. O barro era a chance de virada, de retirá-los do anonimato e iluminar suas vidas.
É da luz do sol e do repouso de trinta dias que começa a confecção. Da mesma forma se inicia a jornada do casal. São dez anos de experiência, iniciados em uma viagem à Guarapari, em que conheceram o processo de produção da panela de barro. No começo, eles realizaram uma sociedade com fabricantes de Guarapari. Quando perceberam que o projeto dava retorno, embarcaram no desafio em carreira solo. Foi nesse momento que descobriram a qualidade do barro de Araçatiba, e, notaram que a matéria-prima de casa é a melhor para a sua produção. Hoje, pode-se dizer que a Loja da Ilha tem produtos totalmente naturais de Viana.
“Aqui no estado, a matéria-prima de qualidade é encontrada apenas em Goiabeiras, mas só pode ser utilizada na região das paneleiras por ser uma região de patrimônio tombado. Encontramos em Araçatiba um barro de igual qualidade e que torna a nossa panela de barro cem por cento vianense”, explica Roberto.
O próximo passo é a trituração. É importante que aqui, o artesão coloque as porções aos poucos, calmamente, para que a máquina - o moedor- consiga moer a terra e que não se estrague com as impurezas presentes. Na receita, são duas unidades de argila para uma de barro. Essa etapa se assemelha à luta diária e contínua que os novos empreendedores tiveram até atingirem o ponto de se sustentar com suas próprias mãos.
As impurezas menores são separadas pela peneira. É um processo perfeccionista, que se segue à adição de água e de descanso no ambiente chamado cocho. São de 15 a 20 dias. Érica conta a importância do respeito às especificidades do produto, “quando se espera esse tempo dele, não é necessária que se faça a cura do material”, revela. “É demorado? É. Mas esse respeito traz a garantia de um produto em perfeito estado”, completa.
A prensa na máquina chamada maromba é o próximo processo. A máquina exige força para compactar e tirar o melhor do barro, dando condições ao pó de se transformar em material propício para criação artística. Assim como o trabalho dos artesãos que produzem as peças. Assim como a lama vira peça essencial para o dia-a-dia, o barro mudou as condições de vida da acabadora, Cristiane Ferreira Lima. A vianense relata que desconhecia a existência da fábrica na região e muito menos como fazer uma panela, e, agora, dois anos depois, ela já participou de quase todas as etapas do processo de construção:
“Só soube que tinha uma fábrica quando estava à procura de uma vaga de emprego. Aqui é uma escola. Quando eu cheguei não sabia fazer nenhuma atividade e desde então passei por todas as fases de produção de uma panela, falta apenas ser uma oleira”, conta Cristiane.
Os blocos são armazenados em lonas de um a dois dias, até a realização do processo de modelagem. Primeiramente, a modeladora sente a textura do barro. Com movimentos cautelosos, ela retira os excessos da matéria e a repassa aos cuidados do oleiro. E aqui é o local em que o barro ganha vida. Com auxílio do torno, uma máquina com uma espécie de tabuleiro que gira em torno de si mesma, o barro é colocado e, através das mãos do oleiro - o artista, ganha forma. É o momento do ápice, onde o nada vira ganha o mundo. Tal qual a Loja do Sítio que tem peças revendidas a todos os estados do país e já alcançou território estrangeiro, como os Estados Unidos e Portugal. Durante nosso encontro, inclusive, os empreendedores estavam produzindo uma série de artefatos para um cliente de São Paulo.
Se alguma inconformidade for encontrada, até aqui é capaz de recomeçar. Durante nossa visita, Roberto contou que a pandemia impactou fortemente a empresa. O número de empregados chegou a 25 em 2019 e precisou ser reduzido à metade e os passeios interativos foram cancelados durante a pandemia. Erica revela que foi necessário dar um passo atrás para que o negócio pudesse se sustentar durante o momento de crise. E, como o barro que é reamassado, recompactado para se tornar útil, as medidas fizeram a Loja do Sítio retomar seu caminho.
Realizados os processos, o produto precisa de secagem. Luz. Passam-se 3 horas recebendo a iluminação solar até que possa retornar para os processos de acabamento. Mas o material não pode estar completamente seco para que sejam adicionadas as alças. Em dias de chuva, as peças são colocadas em um galpão tampado, mas com ventilação. Primeiro, o oleiro trabalha com os contornos da panela, partindo para alças e finalmente repassando o produto para o próximo passo. A arte bruta ganha retoques com pedras e sacos plásticos que produz efeito brilhoso nas peças.
O último ponto é a maquiagem. A panela é colocada em um forno onde o vapor a queima durante cerca de doze horas. Terminado o processo, é hora de ser lavado e fim do tour: o utensílio está pronto para ser comercializado. Da chegada do material até o produto final são cerca de 45 dias de processo inteiro. Das mãos do oleiro saem aproximadamente 200 peças diariamente.
O ineditismo de cada peça criada, a criação intelectual e artística de cada obra e o manuseio dos instrumentos que transformam a matéria-prima que é tida como sujeira em arte, e, sobretudo, o acúmulo sociocultural são o que dão valor às panelas de barro. É um trabalho sensorial, em que o ponto da massa, a estrutura do recipiente e a beleza são avaliadas pelo olhar e tato dos fabricantes.
Para se fazer uma panela de barro, são necessárias algumas viagens: ao passado e à cultura, para trazer os saberes ancestrais na sua confecção, aos terrenos em Araçatiba para coletar o melhor solo para a produção, à imaginação do cliente ou do oleiro para moldar as novas peças e as viagens até a casa dos usuários. Todo esse passeio fica concentrado em um exemplar que se torna em uma estação, capaz de proporcionar novas viagens e encontros carregados de sentimentos, experiências e simbolismos. Ah, e claro, de subjetividade e criatividade do cliente.
SERVIÇO
Local: Loja do Sítio
Endereço: Rua das Trombetas, Nova Bethânia.
Funcionamento: Segunda à sexta, 07h às 17h.
Instagram: @lojadositio_oficial
Site: lojadositio.com.br
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Texto: Israel Magioni
Publicado em sexta-feira, 08 de julho de 2022